Manel Pum, o fogueteiro


      Um foguete ainda rebenta contigo, ó Manel!!! Avisavam as pessoas mais atenciosas. Manel Pum limitava-se a sorrir, e de passos atabalhoados, desaparecia no monte com um caniçal de foguetes debaixo do braço. Depois era um desfile de assobios e rebentamentos a troar pelo vale. Flores de todas as cores e feitios floriam na noite e até as estrelas do céu, envergonhavam-se diante de um estralejar tão majestoso. Era bonito de se ver. Se as lágrimas caíam como vírgulas, o morteiro era o ponto final. Por vezes, durante a largada do fogo, extraviava-se um ou outro foguete que a cambalear, se ia estatelar no meio dos pinheiros. Então, velhaco, Manel explicava estoirando cuspo em todas as direcções:
     É da pólvora. Há pólvora que não tem força para levantar a cana... Como alguns homens que se ouve falar por aí... Dessa pólvora não se queixa a minha Quinita!!
     Quando falava da Quinita todo ele explodia. Esperava-lhe um rebento...o primeiro "arrebento" como dizia. E no final de cada frase deitava abaixo um cálice de bagaço.
     Mas ó Manel, não devias soprar o fogo com a boca cheia de álcool, a criança ainda nasce sem pai... Avisavam os amigos. Ele engalanava-se e dizia com indisfarçavel fogo de vista. Sem pai ou com pai, o miúdo vai ser filho de Manel Pum.
     Na festa do ano seguinte, os que chegaram só por alturas da Festa, notaram a ausência do Manel Pum. As alvoradas não os acordavam e as descargas de fogo pareciam-lhes mortiços estalar de dedos. O que é que é feito do Manel Pum?
     Foi o Samuel dos taxis que contou a razão daquele desaparecimento. Segundo ele, Manel sofreu um grande desgosto quando o seu filho veio ao mundo: Não é que o raio do miúdo nasceu preto!? Preto... Como pólvora queimada... Contou que no hospital, o Manel parecia uma alvorada, doido que andava. Os seus braços rebentavam em mil gestos revoltados: Sou eu que meto as mãos no fogo e é o meu filho que se queima!? Perguntava-se e apontava para a mulher, rebentando em salivas. Fostes tu minha puta!!! Tu é que andastes a brincar com o fogo!!!! E com esta sumiu-se. Não quis saber mais da sua Quinita nem do seu arrebento. Ninguém lhe pôs as vistas em cima durante vários meses.
     A história já andava meio esquecida quando, numa noite de geada, a casa do Jamiro Preto foi pelos ares impulsionada por 32 foguetes. O Jamiro coitadito, lá se finou. Teve a pouca sorte de trabalhar na mesma fábrica onde trabalhava a Quinita.
     O crime foi facilmente resolvido, era um caso de bomba escondida com o rastilho de fora. Manel Pum confessou o crime e, tal como a pólvora, foi de cana. Não é difícil imaginar o que aconteceu a seguir. A pólvora sentindo-se presa, rebenta... PUM!!!
     Mas não é que o rapazito tem hoje a cara chapada do Manel Pum?! Só que é em negativo... Adora flores.

Pedro Martins 2000



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